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Prolongamento de “Amor À Vida” faz o autor praticamente criar nova novela

Nilson Xavier

22/10/2013 12h09

Felix (Mateus Solano) dá as cartas no hospital na nova fase de "Amor À Vida" (Foto: Divulgação/ TV Globo)

Com ordens para espichar "Amor À Vida" – que ficará no ar até o final de janeiro -, a novela entra em uma nova fase em que o autor, Walcyr Carrasco, praticamente levantou uma outra novela – pelo menos nas tramas paralelas.

Infelizmente não foi adiante a ideia de transformar Valdirene (Tatá Werneck) em uma cantora gospel – o que seria um entrecho pra lá de interessante. A personagem começou uma nova fase com o nascimento de sua filha Mary Jane e o casamento com o ricaço Ignácio (Carlos Machado). Tatá e Beth Savalla continuam firmes, rendendo bons momentos.

Perséfone (Fabiana Karla), até então um núcleo "Zorra Total" da novela, ganhou novos contornos com o seu casamento com Daniel (Rodrigo Andrade). O autor abandonou os esquetes sem graça em que a personagem tentava perder a virgindade e a abordagem aos gordinhos agora será do ponto de vista do casamento – e não mais das dificuldades dela para arrumar um namorado, em meio a bullying e humilhações.

Gina (Carolina Kasting), a boa filha-empregada de vida nula com um dúbio sotaque italianado – quem diria – ganhou uma história só para ela, com a chegada de um novo personagem: Herbert (José Wilker). Assim, o autor criou uma nova trama paralela. Carrasco já descartou a hipótese de incesto nesta história. Vamos aguardar por quais conflitos passarão o novo casal.

O quadrilátero Guto-Patrícia-Michel-Silvia (Márcio Garcia, Maria Casadevall, Caio Castro e Carol Castro) continua lá, sem história consistente alguma, a não ser suas desventuras sexuais. Lamenta-se que o autor tenha perdido a chance de limá-los da novela nesta nova fase.

Amarylis (Daniele Winits) segue com uma das personagens mais odiosas de "Amor À Vida" – não tirando a responsabilidade de Eron (Marcello Antony), tão culpado quanto ela na trama da barriga solidária que rendeu a traição dele. E parece que Carrasco tem mesmo algum problema com cabelos. Como se não bastasse a polêmica inútil do raspa-não-raspa a cabeça de Marina Ruy Barbosa, agora o autor entrou em outro quiproquó capilar, desta vez por conta da cabeleira do órfão negro Jaiminho (Kayky Gonzaga). Reclamaram porque o autor pediu uma mudança no look do menino quando ele fosse adotado pelos pais brancos e ricos, o que incluía cortar seu cabelão black-power.

Até parece mesmo vingancinha do autor contra Marina Ruy Barbosa, que não aceitou raspar a cabeça em cena. A personagem Nicole mal aparece na novela mais e sua trama anda bem morna. O foco agora é a paraplegia de Leila (Fernanda Machado). E uma substituta para Nicole já entrou na novela: Natasha (Sophia Abrahão), uma suposta irmã da fantasminha.

Ao som de "I Have the Love", interpretada pelo Simply Red, floresce o amor de terceira idade entre Lutero e Bernarda (Ary Fontoura e Nathalia Timberg), uma trama bonita, que vale a pena ser abordada. E recorrente na obra do autor: o próprio Ary Fontoura formou um par romântico de terceira idade com Nicette Bruno, numa abordagem semelhante, em outra trama de Carrasco: "Sete Pecados" (2007-2008).

A autista Linda finalmente – e felizmente – começa a ter sua história desenvolvida na novela. Bruna Linzmeyer está ótima na personagem, bem como todo seu núcleo, inclusive a mãe chata e repressora, interpretada por Sandra Coverloni. De quebra, o autor deu continuidade à participação de Rainer Cadete, o intérprete do advogado Rafael, que havia perdido função na novela, mas agora está apaixonado por Linda.

Como já comentei aqui no blog anteriormente, Ninho (Juliano Cazarré) teve sua personalidade alterada pela terceira vez por conta da necessidade de roteiro. O personagem começou como um tipo hippie-adicto-sedutor, que enlouqueceu de paixão a patricinha Paloma (Paolla Oliveira). Para raptar a filha Paulinha (Klara Castanho), Ninho se transformou num bobalhão, uma releitura de seu Adauto de "Avenida Brasil". Na fase atual, para justificar novos entrechos, Ninho voltou de Nova York como um artista de certa repercussão. Agora Ninho é yuppie. Será que até o final de janeiro ele muda de novo?

Os temas médicos continuam pipocando na novela, ainda que superficialmente. Pelo menos para justificar o cenário do Hospital San Magno. A doente da vez é Vívian (Ângela Dip), dona do bar frequentado pelos personagens da novela. Alcoólatra, ela foi diagnosticada com cirrose. Ganha Ângela Dip, ótima atriz cujo talento vinha sendo desperdiçado.

O romance proibido entre os médicos Pérsio e Rebeca (Mouhamed Harfouch e Paula Braun) ganha ares de "Romeu e Julieta", já que suas famílias não aceitariam o envolvimento entre o muçulmano e a judia. Mas é uma trama que só se desenrola agora, consequência de uma chantagem do vilão Félix (Mateus Solano).

A Dr.ª Glauce (Leona Cavalli) aparece quando o autor lembra da personagem para alguma armação do mal. Será que ele lembra ainda do assassinato da enfermeira Elenice (Nathalia Rodrigues)?

Emílio Orciollo Netto segue fazendo figuração de luxo na novela. Mal aparece. E quando aparece, mal fala.

Enquanto isso segue a trama central de "Amor À Vida", envolvendo a família Khoury e a ambição desmedida de Félix. O vilão mudou seu alvo. Primeiro queria afastar a irmã, que ameaçava seu poder no Hospital San Magno. Para tanto, cometeu atrocidades, como jogar a sobrinha recém-nascida em uma caçamba de lixo, e, mais tarde, planejar o sequestro dela. Hoje, Félix quer se vingar do pai César (Antônio Fagundes) e estancar a escalada de Aline (Vanessa Giácomo).

Tem muito pano pra manga a render até o final de janeiro. Disso não podemos reclamar de Walcyr Carrasco: ele sabe costurar tramas como ninguém, usando várias histórias paralelas. Diferente de "Salve Jorge", que – com exceção da trama principal – teve uma gama enorme de subtramas desperdiçadas e mal desenvolvidas, do início ao fim.

Sobre o autor

Nilson Xavier é catarinense e mora em São Paulo. Desde pequeno, um fã de televisão: aos 10 anos já catalogava de forma sistemática tudo o que assistia, inclusive as novelas. Pesquisar elencos e curiosidades sobre esse universo tornou-se um hobby. Com a Internet, seus registros novelísticos migraram para a rede: em 2000 lançou o site Teledramaturgia (http://www.teledramaturgia.com.br/), cujo sucesso o levou a publicar o Almanaque da Telenovela Brasileira, em 2007.

Sobre o blog

Um espaço para análise e reflexão sobre a produção dramatúrgica em nossa TV. Seja com a seriedade que o tema exige, ou com uma pitada de humor e deboche, o que também leva à reflexão.

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