“Segunda Dama” recicla bem um velho clichê da dramaturgia
Está de volta à TV o batidíssimo clichê dos gêmeos (ou sósias), de personalidades (e/ou condições sociais) opostas que trocam de lugar. Quem viu a estreia da série "Segunda Dama" nesta quinta-feira (15/05) achou que já conhecia essa história. As referências em nossa Teledramaturgia são muitas. "Mulheres de Areia", novela de Ivani Ribeiro, exibida na Tupi em 1973, e, no remake da Globo, em 1993, talvez seja a primeira lembrança.
Mas essa trama foi contada também em "Cara e Coroa", de Antônio Calmon (1995), e na cultuada mexicana "A Usurpadora", reprisada N vezes no SBT. O fato da rica tomar o lugar da pobre e vice-versa também remete a "Brega e Chique", novela de Cassiano Gabus Mendes (1987). Mas as referências não param por aí: "Vidas Cruzadas", de Ivani Ribeiro (1965), "O Semideus", de Janete Clair (1973) e "O Outro", de Aguinaldo Silva (1987). E variações sobre esse tema são encontradas ainda em muitos outros títulos. "Trocas de vidas" é um clássico do folhetim.
Mas o tema não é primazia da Telenovela. O romance "O Duplo", de Dostoievski, narrava a história de um sósia que usurpava o lugar do outro. No caso de "Segunda Dama", talvez a semelhança maior seja com "O Príncipe e o Mendigo", famoso livro de Mark Twain, em que um jovem príncipe entediado com a vida no castelo conhece um sósia, mendigo, e um toma a vida do outro – inclusive teve uma versão em novela, na Record, em 1972, com Kadu Moliterno. O cinema também explorou esse filão, em filmes como "O Terceiro Homem", de Carol Reed (1949), "O Segundo Rosto", de John Frankenheimer (1966), "Kagemusha" de Akira Kurosawa (1980), etc.
Quando o clichê é inevitável, o que vale é a nova forma de contar a história. E é nisso que "Segunda Dama" se alicerça. Heloísa Périsée faz bem a caricatura da moça pobre do subúrbio, engraçada, trabalhadora, um tanto quanto ingênua, mas cafona e sem modos. Merece elogios também a atuação da atriz como a gêmea milionária, triste com o vazio de sua vida luxuosa. Na verdade, Périsée se desdobra em quatro personagens diferentes: a gêmea pobre Marali, a gêmea rica Analu, Marali se passando por Analu, e Analu se passando por Marali. É um exercício aprendido com os diretores Wolf Maya e Carlos Magalhães, os mesmos do remake de "Mulheres da Areia", da Globo, em que Glória Pires viveu a gêmea boa Ruth, a gêmea má Raquel, Ruth se passando por Raquel, e Raquel se passando por Ruth.
Está tão claro que em momento algum "Segunda Dama" tem a pretensão de alguma originalidade, que até a abertura da série é uma reciclagem: lembra a abertura da novela "A Favorita" (de 2008, inclusive no tema musical), que por sua vez lembrava a abertura de "Cobras e Lagartos" (2006), que por sua vez lembrava a abertura de "Gente Fina" (1990). Mas, para funcionar e convencer o público, exige-se que o "mais do mesmo" se torne "diferente". Alguém já disse uma vez que a Telenovela é a arte de um contar uma mesma história só que de forma diferente. Tem sido assim nessas mais de seis décadas de Teledramaturgia.
Apenas uma ressalva: o exagero nos filtros, que fazem Heloísa Perisée parecer uma boneca de cera na tela.
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