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As novelas que se destacaram e as que decepcionaram em 2014

Nilson Xavier

23/12/2014 10h02

Destaques de 2014:

Destaques de 2014: "Meu Pedacinho de Chão" e "O Rebu" (Foto: Divulgação/TV Globo)

Para quem preza mais a qualidade do que números de audiência, fica difícil avaliar de forma fria as "melhores" e as "piores" novelas do ano. O maior exemplo é "Além do Horizonte". A novela será sempre lembrada como "um fracasso de audiência", mas teve pontos tão positivos que a distanciam de ser classificada como um fracasso em termos de qualidade. Foi uma trama que priorizou a aventura e o mistério em detrimento à fórmula folhetinesca tradicional. Só por isso, vale o mérito. Conseguiu se reinventar sem descaracterizar sua proposta inicial. E a Globo sabia que era um projeto arriscado. Prova de que a emissora está disposta a avançar em experimentações, nem que seja ocasionalmente.

Outro exemplo disso é a ótima "Meu Pedacinho de Chão". Projeto audacioso e arrojado da emissora, um dos destaques de 2014, mas que teve uma baixa audiência. Uma novela narrada como um contos de fadas, de apelo infantil, usando elementos lúdicos, e de altíssima qualidade de produção. Isso tudo – mais a direção sempre empolgante de Luiz Fernando Carvalho e o texto sensível de Benedito Ruy Barbosa -, a fazem uma das melhores produções da TV brasileira dos últimos tempos.

"O Rebu" também não foi um sucesso de audiência. Mas a qualidade da produção, texto e direção é inquestionável. Errou sim, em alguns momentos, no roteiro, pouco salutar ao telespectador médio, e que, algumas vezes, mais confundiu do que ajudou o público a montar o quebra-cabeças da trama. Mas nada que desabonasse ou maculasse o resultado final. Também merece ser um dos destaques do ano.

2014 começou com o último mês de exibição de "Amor à Vida". A questionável qualidade de texto de Walcyr Carrasco não impediu que a novela tivesse um forte apelo popular e que personagens como Félix (Mateus Solano), Márcia (Elizabeth Savalla) e Valdirene (Tatá Werneck) se tornassem alguns dos mais queridos dos últimos tempos. O grande destaque foi a abordagem da homossexualidade – através da relação de Félix com seu pai vilão, César (Antônio Fagundes). E propiciou um dos mais emocionantes finais de último capítulo da história das telenovelas: a reconciliação de Félix e César.

"Joia Rara" (terminou em abril), a ganhadora do Emmy, cumpriu bem sua tarefa como produção: uma caprichada remontagem de época. Mas ainda ficou devendo em história. Também falhou no roteiro a sonolenta "Em Família", lançada como "a última novela de Manoel Carlos", mas que em nada lembrou os áureos tempos do novelista, com seus folhetins da década de 1990. Um desacerto entre roteiro e direção (Jayme Monjardim), que resultou em uma trama lenta e mal alinhavada e que afugentou o telespectador. Sim, o texto de Maneco continua bom, ainda mais se encontra atores à altura. Mas novela precisa de mais, bem mais. Acabou entre os piores resultados de 2014.

Além de "Em Família", o ano apresentou outra grande decepção: "Geração Brasil", a novela de Filipe Miguez e Izabel de Oliveira, a mesma dupla que fez o sucesso "Cheias de Charme", em 2012. Desconsiderando a grande expectativa dos fãs da novela anterior da dupla, "Geração Brasil" ficou devendo muito. Ousou ao tratar tecnologia e nerds, mas só cansou com uma temática que revelou-se pouco folhetinesca. Uma ótima ideia, a princípio, mas que, na prática, não funcionava. Salvaram-se poucos bons momentos de alguns atores – como Luís Miranda e sua Dorothy Benson.

Decepções:

Decepções: "Geração Brasil" e "Em Família" (Foto: Divulgação/TV Globo)

A Record tenta, mas está praticamente impossível concorrer com o carro-chefe da Globo – a novela das nove. "Pecado Mortal", de Carlos Lombardi, foi um dos melhores folhetins já produzidos pela emissora, mas que pouca gente viu – uma pena. Tanta coisa deu certo ali – como Victor Hugo vivendo o vilão Picasso. A novela terminou em maio e foi substituída por "Vitória", de Cristianne Fridman, onde ficou claro no primeiro capítulo o esforço em não arriscar e fazer um produto bem tradicional, sem maiores ousadias. O mais longe que a novela conseguiu ir ficou na abordagem ao neonazismo. Mas, mesmo assim, de maneira ainda pouco empolgante. Em nada lembra os melhores trabalhos de Fridman na Record.

O SBT segue firme e forte em dois segmentos: a reprise vespertina de novelas importadas (ou de suas produções de texto importado), e o filão infantil iniciado com "Carrossel" em 2012. "Chiquititas" caminha para seu segundo ano de exibição ininterrupta. Os resultados não são tão impactantes como na época de "Carrossel", mas a emissora tem público cativo e vem adquirindo know-how com suas produções infantis. O melhor exemplo é a série "Patrulha Salvadora", exibida ao longo deste ano, de produção melhor acabada.

Como de praxe, a temporada 2013 de "Malhação" terminou na metade de 2014 e foi substituída pela nova temporada. Aqui, nada de novo no front. A fórmula continua sendo proveitosa para a Globo – apesar da diminuição da audiência a cada temporada (na verdade reflexo da televisão em geral). Ao menos, forma novos atores, autores e diretores.

"Império" (começou em julho), de Aguinaldo Silva, tem lá seus méritos. Ótima direção (núcleo) de Rogério Gomes (o que é um bom diferencial para Aguinaldo), elenco bem escalado e alguns personagens que caíram no gosto do público. Algumas histórias se destacam em detrimento às outras, mas nenhuma forte o bastante para fazer o público vibrar. Ainda falta um borogodó em "Império". O Ibope está bom e a novela é melhor que as três últimas do horário. Já estamos no lucro.

"Boogie Oogie" (começou em agosto), do estreante (como autor solo) Rui Vilhena, causou furor ao apresentar uma trama ágil e dinâmica, com muitas reviravoltas toda semana. Uma boa produção com a direção sempre certa de Ricardo Waddington. Já passou da metade. Vai manter o ritmo de sempre? Vamos torcer! A essa altura, o Rui já deve estar com a língua no chão.

"Alto Astral" (começou em novembro), do também estreante autor solo, Daniel Ortiz, aqui supervisionado por seu mestre Silvio de Abreu, em direção de núcleo de Jorge Fernando. Depois de duas ousadias às sete horas, era natural que a Globo voltasse com uma novela despretensiosa. Começou extremamente romântica, é leve e o humor vai aumentando paulatinamente. Tem pouco tempo no ar e pode render muito ainda.

Com exceção de "Em Família" e "Geração Brasil" – as maiores decepções do ano – 2014 foi bom para as novelas, mesmo com intempéries como a Copa e a campanha eleitoral. Graças à habilidade de Aguinaldo Silva em fisgar o público, o horário das nove vê bons resultados novamente. Importante salientar também a oportunidade que a Globo vem dando a novos talentos: Carlos Gregório e Marcos Bernstein ("Além do Horizonte"), George Moura e Sergio Goldenberg ("O Rebu"), Rui Vilhena ("Boogie Oogie") e Daniel Ortiz ("Alto Astral").

Sobre o autor

Nilson Xavier é catarinense e mora em São Paulo. Desde pequeno, um fã de televisão: aos 10 anos já catalogava de forma sistemática tudo o que assistia, inclusive as novelas. Pesquisar elencos e curiosidades sobre esse universo tornou-se um hobby. Com a Internet, seus registros novelísticos migraram para a rede: em 2000 lançou o site Teledramaturgia (http://www.teledramaturgia.com.br/), cujo sucesso o levou a publicar o Almanaque da Telenovela Brasileira, em 2007.

Sobre o blog

Um espaço para análise e reflexão sobre a produção dramatúrgica em nossa TV. Seja com a seriedade que o tema exige, ou com uma pitada de humor e deboche, o que também leva à reflexão.

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