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“Verdades Secretas”: bom exemplo de união entre roteiro, direção e elenco

Nilson Xavier

26/09/2015 00h52

Drica Moraes como Carolina (Foto: Reprodução)

Drica Moraes como Carolina (Foto: Reprodução)

"Verdades Secretas", a novela da faixa das onze, de Walcyr Carrasco – que terminou nesta sexta-feira (25/09) – foi a de maior repercussão do horário desde a sua implantação, em 2011, e a de maior audiência: termina com média final de 20 pontos no Ibope da Grande São Paulo – anteriormente, os remakes de "O Astro" e "Gabriela" fecharam em 19. O público vibrou com uma premissa pouco coerente, mas ousada: o homem que se casa com uma mulher apenas para ser amante da filha dela. O submundo da moda serviu como pano de fundo.

Carrasco, um bom criador de histórias, fez de "Verdades Secretas" uma novela de voyeurismo e, do telespectador, a testemunha ocular de sua trama como aquele que espia a vida alheia pela fechadura da porta, sozinho, na calada da noite, ávido por uma sacanagenzinha. Desta forma, quase tudo foi mostrado, como raras vezes mostrou-se antes em uma novela: drogas, homossexualidade e prostituição (tudo junto ou separado), com boa carga erótica e muitos nudes. Este recheio, muitas vezes, soou gratuito, mas deu um tempero especial à produção e garantiu boa repercussão.

A trama envolvente e a ousadia das abordagens fizeram de "Verdades Secretas" uma das melhores novelas do autor. Carrasco, desta vez mais comedido nos diálogos e cauteloso no humor, apresentou-se bem mais sutil do que o usual, quando comparado com trabalhos anteriores. Isso precisa ser considerado já que sua peculiar falta de sutileza nos diálogos e no humor – característica do autor – poderia pôr a perder todo o excelente trabalho da direção.

Mas não. Ainda que a história central e seu desenrolar soasse pouco coerente ou crível. Ainda que os xingamentos entre o exagerado Viscky (Rainer Cadete) e sua amiga/inimiga/amante Lurdeca (Dida Camero) tenham preenchido a cota carrasquiana. E ainda que alguns diálogos, em momentos isolados, parecessem forçados – como aquele "acerto de contas" entre Alex e seu filho (Rodrigo Lombardi e João Vitor Silva) que levou o garoto a afundar-se nas drogas.

Ponto para a direção, que conseguiu driblar, ou mascarar, algumas falhas de roteiro. O que seria da história de Walcyr Carrasco não fosse a direção primorosa de Mauro Mendonça Filho e sua equipe. A proposta estética e a fotografia sofisticadas, o esmero nas tomadas, a trilha sonora escolhida a dedo para cada tipo de cena e a direção de atores contribuíram para um resultado final poucas vezes visto na televisão. Evidente que a seu favor, autor e diretor tiveram o horário e o formato (novela mais enxuta, com menos tramas e personagens), o que permitiu extrapolar o trivial e apresentar um trabalho mais bem acabado.

Marieta Severo / Grazi Massafera / Eva Wilma (Fotos: Reprodução)

Marieta Severo / Grazi Massafera / Eva Wilma (Fotos: Reprodução)

O elenco respondeu à altura da proposta. A estreante Camila Queiroz (Arlete/Angel) fez bonito, passando a naturalidade e a jovialidade exigidas pela personagem. Aguardemos seu próximo trabalho. Drica Moraes exorcizou de vez a Cora de "Império", um tipo que pouco lhe contribuiu ou favoreceu. Diferente de Carolina, personagem mais complexa, que poderia beirar o ridículo (por conta de sua trajetória na trama) não fosse a dimensão dramática que a atriz lhe conferiu.

Marieta Severo também exorcizou seu último trabalho. Fanny em nada lembrou Dona Nenê da série "A Grande Família". Era para Marieta ter voltado às novelas há mais tempo. Eva Wilma emprestou toda a sensibilidade que sua personagem, Dona Fábia, demandava, num trabalho preciso e marcante. É outra atriz que consegue extrapolar o texto, lhe dando credibilidade. Destaque também para Ágatha Moreira (Giovanna), João Vitor Silva (Bruno) e Rainer Cadete (Viscky), muito bem em seus papéis.

Outra que muito brilhou – tendo inclusive desviado os holofotes da trama central – foi Grazi Massafera, como a modelo drogada Larissa. Grazi surpreendeu não apenas com a caracterização e com as várias cenas difíceis exigidas, envolvendo drogas, prostituição e cracolândia. A atriz conseguiu passar a verdade nua e crua da personagem de forma visceral, arrancando elogios de toda parte. E ela muito deve ao trabalho da direção. "Verdades Secretas" é um bom exemplo de união entre roteiro, direção e elenco.

É notável a recepção dessa novela no momento de forte resistência da audiência às tramas das nove da emissora ("Babilônia" e "A Regra do Jogo"). Todas elas tratam/trataram de temas espinhosos para a sociedade – guardadas as devidas proporções que os horários de exibição permitem. Aí entra uma outra questão: são públicos distintos? Ou releva-se "Verdades Secretas" por avançar para além da meia-noite? Todos os públicos gostam de temáticas fortes, ou a audiência está segmentada?

Veja também: O melhor e o pior de "Verdades Secretas" (Maurício Stycer)

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Alex (Rodrigo Lombardi) e Angel (Camila Queiroz) (Foto: Divulgação/TV Globo)

Alex (Rodrigo Lombardi) e Angel (Camila Queiroz) (Foto: Divulgação/TV Globo)

Sobre o autor

Nilson Xavier é catarinense e mora em São Paulo. Desde pequeno, um fã de televisão: aos 10 anos já catalogava de forma sistemática tudo o que assistia, inclusive as novelas. Pesquisar elencos e curiosidades sobre esse universo tornou-se um hobby. Com a Internet, seus registros novelísticos migraram para a rede: em 2000 lançou o site Teledramaturgia (http://www.teledramaturgia.com.br/), cujo sucesso o levou a publicar o Almanaque da Telenovela Brasileira, em 2007.

Sobre o blog

Um espaço para análise e reflexão sobre a produção dramatúrgica em nossa TV. Seja com a seriedade que o tema exige, ou com uma pitada de humor e deboche, o que também leva à reflexão.

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