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"Totalmente Demais" é eficaz ao dar novos contornos a arquétipos conhecidos

Nilson Xavier

22/03/2016 12h23

Marina Ruy Barbosa e Paulo Rocha (Foto: Inácio Moraes/Gshow)

Marina Ruy Barbosa e Paulo Rocha (Foto: Inácio Moraes/Gshow)

Não existe uma fórmula de sucesso para uma novela. Uma junção de fatores, internos e externos, podem colaborar para isso. Em suma, a novela é arte de contar uma mesma história, mas de forma diferente. O que se faz é mudar uma coisa aqui e outra ali para sempre trazer uma novidade ao público. Exemplo disso é "Totalmente Demais", a atual atração das sete da noite da Globo, o maior sucesso do horário desde "Cheias de Charme" (2012). É uma trama das mais despretensiosas – como foram também as duas últimas da faixa, "Alto Astral" e "I Love Paraisópolis", mas inferiores em repercussão.

Um dos méritos dos autores Rosane Svartman e Paulo Halm está na história simples, inspirada em arquétipos de contos de fadas, que já geraram romances, peças de teatro e filmes famosos. Ou seja: uma história conhecida de todos. A protagonista Eliza (Marina Ruy Barbosa) é a gata borralheira da vez. A princípio rude, mas ingênua, vimos sua paulatina transformação em princesa através do concurso da trama. Passados mais de cem capítulos, findo o concurso, a dois meses do término da novela, a história de Eliza ganha agora novos contornos que ainda podem render bastante.

O barbudão Dino (vivido pelo ator português Paulo Rocha) faz agora as vezes da madrasta má, em substituição a Carolina (Juliana Paes). Mas ele é pior: é o padrasto que persegue a enteada com sede de vingança pela rejeição. Isso reverbera no público de forma potencializada. Dino surge na vida de Eliza não como madrasta da Cinderela. Está mais para o Lobo Mau querendo a Chapeuzinho. O desejo sexual implícito no personagem (e entendido pelo público) é a força motriz da história de terror que se transformou o conto de fadas de Eliza.

Em contrapartida, Arthur (Fábio Assunção) há muito deixou de ser o Príncipe, ou melhor, a salvação da mocinha dessa história. A própria Eliza não se ilude com sua figura charmosa e sedutora. Esse comportamento assexual da personagem – já percebido de sua relação com Jonatas (Felipe Simas) – reflete o asco que sente pelo padrasto odioso. Germano (Humberto Martins), agora revelado o pai biológico da mocinha, vem ocupar essa posição de salvador, a lacuna do amparo que sempre lhe faltou. Mais condizente para livrá-la das garras de seu malfeitor e carrasco. Dino é o verdadeiro vilão dessa história, que apresenta um perigo muito maior do que Carolina. A integridade física e psicológica de Eliza lhe valem mais do que o sonho de princesa.

Os autores prometeram novos entrechos e desdobramentos para a trajetória da heroína após o Concurso Totalmente Demais. E estão cumprindo à altura. A novela é eficiente ao reciclar arquétipos de mitos que todos reconhecem e entendem, trazidos à luz da modernidade, dando novos contornos e rumos.

Rosane Svartman e Paulo Halm conseguem ainda a façanha de unir públicos distintos para uma mesma obra. "Totalmente Demais" tem a pegada jovem de "Malhação" (a bem sucedida temporada do ano passado foi o último trabalho da dupla) aliada ao apelo folhetinesco do público tradicional de novelas. Um elenco bem escalado, personagens carismáticos, disputas, inclusive amorosas, que dividem o público, drama e comédia – ingredientes de sucesso fartamente testados anteriormente mas que nem sempre atingiram o objetivo. Aqui vêm atingindo.

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Sobre o autor

Nilson Xavier é catarinense e mora em São Paulo. Desde pequeno, um fã de televisão: aos 10 anos já catalogava de forma sistemática tudo o que assistia, inclusive as novelas. Pesquisar elencos e curiosidades sobre esse universo tornou-se um hobby. Com a Internet, seus registros novelísticos migraram para a rede: em 2000 lançou o site Teledramaturgia (http://www.teledramaturgia.com.br/), cujo sucesso o levou a publicar o Almanaque da Telenovela Brasileira, em 2007.

Sobre o blog

Um espaço para análise e reflexão sobre a produção dramatúrgica em nossa TV. Seja com a seriedade que o tema exige, ou com uma pitada de humor e deboche, o que também leva à reflexão.

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