JUSTIÇA chega ao fim como uma das melhores produções da TV nos últimos anos
Sucesso de público e crítica, a série "Justiça" chegou ao fim (nesta sexta, 23/09) como uma das melhores produções da televisão brasileira neste ano. Ou melhor: nos últimos anos!
A única crítica fica por conta de algumas pontas soltas no roteiro, que exigiram mais do que boa vontade do telespectador. Ainda paira no ar a dúvida com a relação à temporalidade na ação que vai do atropelamento de Beatriz (Marjorie Estiano) à prisão de Maurício (Cauã Reymond). Em uma noite aconteceu: o atropelamento, a vinda do socorro, a internação, o diagnóstico médico de que ela estava tetraplégica, a decisão dela de morrer, a eutanásia em si, a chegada da polícia, a prisão e a ação na delegacia!
Outra questão diz respeito à morte de Vicente (Jesuíta Barbosa): o que aconteceu com seu carro, batida ou tiro? Tinha a influência de algum outro personagem? Não ficou claro. Pela natureza da série, o telespectador esperou os episódios seguintes para saber. Mas a resposta veio apenas no último frame do episódio final: estava estampado no jornal, juntamente com desfechos de outros personagens [imagem abaixo]. Interessante, já que os crimes do início da trama também eram mostrados como notícia de jornal. Só que dessa vez eram quatro notícias e não houve tempo hábil para o telespectador ler tudo. Interessante, mas não foi eficiente.
Relevemos esses deslizes e forçadas de barra. Ao final, não comprometeram a obra em sua totalidade. O roteiro mostrou-se eficiente dentro da proposta de cruzar tramas e personagens com protagonismos separados por dia. Melhor ainda: por não cair no lugar comum e na previsibilidade do clichê fácil, tão comum nas novelas. "Justiça" revelou-se um trabalho muito rico no conteúdo – sua maior qualidade -, suscitando reflexões ao discutir a linha tênue que separa a justiça subjetiva da vingança.
A autora – Manuela Dias – deu um desfecho original e diferente a cada protagonista. Maurício foi o único que conseguiu cumprir seu plano de vingança a contento, sem precisar sujar as mãos – ainda que tenha usado Vânia (Drica Moraes) e isso tenha custado a vida dela. Fátima (Adriana Esteves), a única presa injustamente, teve, aparentemente, um final feliz. Um sopro de esperança entre tantas histórias trágicas. Porém, a filha não largou a prostituição. Fátima está realmente feliz?
Elisa (Débora Bloch) havia desistido de se vingar, mas o acaso deu um empurrãozinho. No final, ela desfez o quarto da filha assassinada como a exorcizar o passado. Para ela, acabou. Racionalmente, Elisa livrou-se do que a incomodava. Débora também se vingou. Ela e Elisa cobraram um crime com outro. Porém, diferente de Elisa, Débora não conseguiu racionalizar a sua sede de vingança. Pelo contrário: ao longo de sua trajetória, foi dando claros sinais de insanidade. A imagem da personagem perambulando na estrada é o mais triste dos desfechos. Já sua amiga Rose (Jessica Ellen) acabou unindo-se ao traficante que, indiretamente, foi um dos responsáveis por sua prisão. Nada muito diferente da tão questionável atração entre Elisa e Vicente.
O roteiro instigante de "Justiça" veio acompanhado de uma direção artística primorosa, de José Luiz Villamarim, com cenários reais de Recife, em fotografia de Walter Carvalho, e uma trilha sonora empolgante. São diferenciais e tanto, principalmente na intenção de afastar-se do eixo Rio-SP e de auferir o máximo de naturalismo na narrativa. O elenco todo fez bonito, com destaque às grandes interpretações de Débora Bloch, Jesuíta Barbosa, Camila Márdila, Adriana Esteves, Enrique Diaz, Leandra Leal, Julia Dalavia, Luísa Arraes, Jessica Ellen, Antônio Calloni e Drica Moraes. Ainda as participações rápidas e especiais de Marina Ruy Barbosa e Marjorie Estiano.
A repercussão de "Justiça" é uma prova de que o público ainda responde bem quando a TV aberta oferece uma proposta original, de qualidade técnica e artística, e que nada fica a dever às melhores produções estrangeiras, da TV a cabo ou plataformas on demand e serviços de streaming.
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