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Retrospectiva 2017: o ano em que o público fez as pazes com as novelas

Nilson Xavier

28/12/2017 07h00

Juliana Paes, Sérgio Guizé e Bianca Bin (Foto: Divulgação/TV Globo)

Em 2016, houve quem vislumbrasse o fim das telenovelas. O nobilíssimo horário das nove, o de maior audiência e faturamento da Globo, sofria com uma sequência de produções com audiência abaixo da esperada pela emissora. "A Lei do Amor" adentrou 2017 com Ibope parco e como uma das novelas mais criticadas da história. Eis que surge Glória Perez com a sua inspirada "A Força do Querer" e arruma a casa!

A autora conquistou o público com seus dramas bem alinhavados, de poucos tropeços, encabeçados por uma galeria de personagens femininas carismáticas (Bibi, Jeiza, Ritinha, Ivana, Joyce, Silvana). A trama, folhetinesca em ressonância com a atualidade, levantou temas como identidade de gênero e a violência das grandes cidades como nunca visto. Foi a maior audiência e a maior repercussão no horário desde "Avenida Brasil", em 2012. Para coroar esse sucesso, 50 pontos no Ibope da Grande SP no último capítulo. Alguém falou em "fim das telenovelas"?

A prova de que o gênero se reinventou em 2017 foi sentida também nos demais horários. Às 7 da noite, "Rock Story" andou na contramão das comédias leves tradicionais apostando em um anti-herói errado, o roqueiro Gui Santiago (Vladimir Brichta), em uma história que explorava o universo da música de forma sedutora sem apelar facilmente para os recursos batidos que garantem audiência. Terminou aclamada pelo público e crítica como uma das novelas mais interessantes dos últimos tempos.

Rock Story | Novo Mundo | Malhação, Viva a Diferença

O mesmo pode-se afirmar de "Novo Mundo", às seis. Ao sabor da liberdade poética, a novela recontou parte da História do Brasil adaptando a realidade em nome do bom folhetim ao mesclar personagens reais e fictícios, com uma galeria de tipos inesquecíveis: Leopoldina (Letícia Colin), Dom Pedro (Caio Castro), Germana (Vivianne Pasmanter), Elvira Matamouros (Ingrid Guimarães) e outros. Já a temporada 2017 de "Malhação", sabiamente chamada de "Viva a Diferença", trouxe novo gás à novelinha vespertina: mudou o cenário (que estava há mais de vinte anos preso ao Rio de Janeiro) enquanto o texto (de Cao Hamburger) aborda temas atuais sem subestimar o jovem. Fim das telenovelas? Ao contrário! Novelas para todos os gostos e perfis.

Mas nem tudo foram flores, pelo menos para a concorrência.

SBT e Record estavam entre as emissoras que boicotaram as operadoras de TV a cabo no primeiro semestre do ano. Impactadas na audiência, voltaram atrás. A Record, particularmente, sofreu com um ano ruim. As esperanças de repetir o fenômeno "Os Dez Mandamentos" foram por água abaixo com novelas minguando na audiência. Enquanto a pouco inspirada "Belaventura" – um arremedo de histórias medievais com produção e elenco dos mais irregulares – ajuda a derrubar o Ibope do início da noite, a atração seguinte, "O Rico e Lázaro", ligou o alerta amarelo para a possibilidade de esgotamento da fórmula "novela bíblica".

Belaventura | Apocalipse | Carinha de Anjo

Fechando o ano de dissabores, a maior aposta da Record, "Apocalipse", só tem decepcionado. O pomo da discórdia é Christiane Cardoso, filha de Edir Macedo, que revisa o texto da novelista Vívian de Oliveira, mesmo sem entender patavina de novela. Em contrapartida, o SBT manteve seu público cativo levando vantagem com o mau momento da Record: "Carinha de Anjo", um amadurecimento da fórmula "novela infantil", segue firme mesmo com o espichamento.

Deu onda

Enquanto "Malhação" e "Novo Mundo" levantavam a audiência do fim da tarde, e "Rock Story" deixava um legado de bom Ibope, a novela substituta às sete, "Pega Pega", surfou nos altos números mesmo com uma trama sem novidade e um casal romântico central insosso (Eriza). Pasme: é a maior audiência do horário desde "Cheias de Charme" (2012). Se isso não representa as pazes do público com as telenovelas, como explicar essa audiência? Outro exemplo: "Os Dias Eram Assim" – a "supersérie" – teve seu horário alterado para surfar nos ótimos números de "A Força do Querer", exibida antes. Uma trama mediana que terminou com o maior Ibope entre todas as "novelas das 11".

Pega Pega | Os Dias Eram Assim | Tempo de Amar

As novelas de 2017 também passaram incólumes pela chegada do Horário de Verão e das festas de fim de ano – o terror de todo novelista, já que as audiências geralmente caem no período. "Tempo de Amar" causou estranhamento em seu início, mas segue firme com uma história folhetinesca e sedutora. E Walcyr Carrasco já tem o público cativo com "O Outro Lado do Paraíso". Trama simplória, texto didático e repetitivo e personagens maniqueistas – tudo muito raso. Porém, uma carpintaria notável na criação de catarses e na entrega do que o público quer ver – característica do autor que lhe confere o título de "fenômeno de audiência".

Ao que tudo indica, a Teledramaturgia tradicional tem fôlego de sobra para 2018. Não será dessa vez o fim das telenovelas.

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Fotos: divulgação, por suas respectivas emissoras.
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Sobre o autor

Nilson Xavier é catarinense e mora em São Paulo. Desde pequeno, um fã de televisão: aos 10 anos já catalogava de forma sistemática tudo o que assistia, inclusive as novelas. Pesquisar elencos e curiosidades sobre esse universo tornou-se um hobby. Com a Internet, seus registros novelísticos migraram para a rede: em 2000 lançou o site Teledramaturgia (http://www.teledramaturgia.com.br/), cujo sucesso o levou a publicar o Almanaque da Telenovela Brasileira, em 2007.

Sobre o blog

Um espaço para análise e reflexão sobre a produção dramatúrgica em nossa TV. Seja com a seriedade que o tema exige, ou com uma pitada de humor e deboche, o que também leva à reflexão.

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