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“A Força do Querer” mobilizou audiência, mas não foi unanimidade

Nilson Xavier

20/10/2017 23h31

Juliana Paes e Rodrigo Lombardi

Se "A Força do Querer" não foi "a novela que uniu todas as tribos", chegou bem perto. Foi praticamente impossível permanecer indiferente a ela. E tampouco foi unanimidade. Elogios e críticas vieram de todos os lados. E a autora, Glória Perez, como sempre, a postos e munida para rebater todas as críticas. Da interpretação de Fiuk – escalação infeliz de um ator sem estofo para um personagem tão importante – às acusações de apologia ao crime e glamurização da bandidagem – referência à trama da personagem Bibi Perigosa, de Juliana Paes.

Glória voltou às novelas inspirada. Acho "A Força do Querer" ainda melhor que "O Clone" (2001-2002), seu último sucesso arrebatador. Esse excelente resultado se deve a três fatores que trabalharam juntos e em sincronia: a habilidade da autora na condução de suas tramas; a direção caprichada e original de Rogério Gomes, Pedro Vasconcelos e equipe; e o elenco excepcional (menos o Fiuk). Se algo nesse triunvirato não funcionasse, o efeito para o público não teria sido o mesmo.

Ivan (Carol Duarte)

Parece que Glória aprendeu com os erros da última novela, "Salve Jorge" (2012-2013) – essa sim com críticas indefensáveis. Dessa vez, a autora veio com trama e elenco enxutos. Com vários protagonistas, a história foi costurada de forma que os núcleos se cruzassem e os personagens se conhecessem ou mencionassem os outros. A autora foi hábil na condução de seus núcleos, dando espaço a quase todos e criando oportunidade para a maioria de suas criaturas se destacarem em algum momento.

Claro que houve escorregões. Alguns pontuais, como o personagem Yuri (Drico Alves) e a tentativa de difundir a cultura dos cosplayers e levantar discussão sobre o perigo do jogo da Baleia Azul: abordagens rasas e sem conexão com a novela. Também o desfecho apressado e sem maiores explicações (no último capítulo) do embate Eurico x Nonato (Humberto Martins e Silvero Pereira) e o rompimento de Jeiza e Caio (Paolla Oliveira e Rodrigo Lombardi).

O maior escorregão foi a trama da viciada em jogo Silvana (Lília Cabral): permaneceu a novela inteira praticamente no mesmo patamar para apenas se resolver no último capítulo. Não fosse o talento do quarteto Lília Cabral, Humberto Martins (Eurico), Juliana Paiva (Simone) e Karla Karenina (Dita), não teria sido possível suportar esse núcleo.

O mérito maior de "A Força do Querer" foi a abordagem aos dramas dos transgêneros, através da personagem Ivana-Ivan (Carol Duarte). Glória foi sutil e extremamente feliz no seguimento da história, sem chocar o público e sem causar estardalhaço. Difundiu, explicou (foi didática na medida certa) e alertou sobre o preconceito, tendo o respaldo da direção e elenco. Além de Carol Duarte, a maior revelação da novela, destacam-se os trabalhos sensíveis de Maria Fernanda Cândido e Dan Stulbach. Como complemento ao drama de Ivana, a figura de Nonato, revelando também Silvero Pereira – "que artista!", como disse Eurico no penúltimo capítulo!

Com um elenco enxuto, menores as possibilidades de atores desperdiçados. Mas houve! Em agosto, listei 6 deles: Juliana Paiva, Gisele Fróes, Mariana Xavier, Edson Celulari, Gustavo Machado e João Camargo (leia AQUI os motivos). Dessa lista, hoje retiro Juliana Paiva, que por fim teve grandes momentos na novela, contracenando com Lília Cabral e Carol Duarte. Entre os coadjuvantes, ainda as atuações irrepreensíveis de Elizângela (Aurora), Tonico Pereira (Abel), Zezé Polessa (Edinalva), Jonathan Azevedo (Sabiá), Silvero Pereira (Nonato), Karla Karenina (Dita) e o pequeno João Bravo (Dedé).

Por fim, o elenco principal com as interpretações brilhantes de Juliana Paes (Bibi), Emílio Dantas (Rubinho), Paolla Oliveira (Jeiza), Marco Pigossi (Zeca), Ísis Valverde (Ritinha), Carol Duarte (Ivana-Ivan), Maria Fernanda Cândido (Joyce), Dan Stulbach (Eugênio), Débora Falabella (Irene), Lília Cabral (Silvana) e Humberto Martins (Eurico), dando vida a tipos complexos, difíceis e ricos. Personagens que despertaram paixões no público e que ainda lembraremos por muito tempo.

"A Força do Querer" cumpriu sua missão com louvor: divertiu, informou e levantou o Ibope e a moral do horário mais nobre da Globo como há muito não se via.

Fotos: divulgação/TV Globo.
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Sobre o autor

Nilson Xavier é catarinense e mora em São Paulo. Desde pequeno, um fã de televisão: aos 10 anos já catalogava de forma sistemática tudo o que assistia, inclusive as novelas. Pesquisar elencos e curiosidades sobre esse universo tornou-se um hobby. Com a Internet, seus registros novelísticos migraram para a rede: em 2000 lançou o site Teledramaturgia (http://www.teledramaturgia.com.br/), cujo sucesso o levou a publicar o Almanaque da Telenovela Brasileira, em 2007.

Sobre o blog

Um espaço para análise e reflexão sobre a produção dramatúrgica em nossa TV. Seja com a seriedade que o tema exige, ou com uma pitada de humor e deboche, o que também leva à reflexão.

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