Por que não se deve comparar "Deus Salve o Rei" com "Que Rei Sou Eu?"
Desde antes de sua estreia, "Deus Salve o Rei" (nova novela das 7 da Globo) sofre comparações com "Game of Thrones", uma das mais bem sucedidas séries da HBO, e com "Que Rei Sou Eu?", novela de capa-e-espada que a Globo produziu em 1989. Concordo com "GoT", afinal são produções atuais e não há dúvida de que a série da HBO inspirou a estética de "Deus Salve o Rei" – mas não apenas ela, também as séries "Vikings", "Once Upon a Time" e outras.
Entretanto, com "Que Rei Sou Eu?" a comparação soa imprópria. São histórias de capa-e-espada sim, mas suas tramas se passam em épocas bem diferentes e são produções em contextos díspares de público e cenário televisivo. Entretanto, foi o próprio diretor de "Deus Salve o Rei", Fabrício Mamberti, quem primeiro citou "Que Rei Sou Eu?" ao anunciar a nova novela: "Quem deu o primeiro sopro para Deus Salve o Rei foi Abu. Ele é um ícone e um mascote desse projeto", referindo-se a Antônio Abujamra, o bruxo Ravengar da novela dos anos 80.
O que une "Deus Salve o Rei" a "Que Rei Sou Eu?" é o fato de serem as únicas produções de capa-e-espada da dramaturgia da Globo – excetuando o período de 1966 a 1969 (início da emissora), com as novelas supervisionadas pela cubana Glória Magadan (como "A Ponte dos Suspiros", "Rosa Rebelde" e "Demian o Justiceiro"). A título de referência, convencionou-se que a dramaturgia da Globo começa para valer a partir de 1970, momento em que a emissora modernizou-se e conquistou a hegemonia nacional.
Vale salientar que "Deus Salve o Rei" e "Que Rei Sou Eu?" são novelas das sete da noite, horário no qual raríssimas vezes a Globo exibiu produções de época: além delas, "Bang Bang", em 2005, com ambientação no faroeste norte-americano, "Kubanacan", em 2003, centrada na década de 1950 em um fictício país da América Latina, e "Estúpido Cupido", produzida em 1976 mas ambientada no início dos anos 1960.
As tramas de "Deus Salve o Rei" e "Que Rei Sou Eu?" não se passam na mesma época, como muitos imaginam: enquanto a primeira tem referências na Idade Média sem precisar o ano, a trama da segunda se inicia em 1786, às vésperas da Revolução Francesa, na transição da Idade Moderna para a Contemporânea. Ou seja, apesar de castelos, rainhas e príncipes, "Que Rei Sou Eu?" não é uma história medieval.
Posto isso, são quase trinta anos que separam as produções de "Deus Salve o Rei" e "Que Rei Sou Eu?". Tirando a abordagem capa-e-espada, são propostas completamente diferentes, produzidas em épocas e contextos da TV brasileira muito diferentes.
"Que Rei Sou Eu?" fazia uma sátira política ao Brasil, uma metáfora entre o fictício Reino de Avilan e o país, sua rainha e conselheiros com nossos políticos. Havia uma forte crítica à corrupção e ao jeitinho brasileiro de se dar bem e levar vantagem. Era uma novela engajada, uma tendência da época – 1989, o primeiro ano em que o brasileiro votou para presidente da República depois de um jejum de mais de vinte anos. Como "Que Rei Sou Eu?", "Vale Tudo" e "O Salvador da Pátria", produções contemporâneas, também tinham esse viés, digamos, social e político. Ainda: era uma época em que as novelas globais dominavam a preferência do povo, como entretenimento sem custo para uma audiência sem muitas opções.
Quase trinta anos depois, o público de "Deus Salve o Rei" é completamente diferente, assim como a nossa Televisão. Hoje, a concorrência com outras formas de entretenimento (entenda plataformas e mídias) tirou da telenovela o posto de rainha do horário nobre. "Deus Salve o Rei" não tem a menor intenção de satirizar a situação política brasileira, como "Que Rei Sou Eu?" fez. São novelas de propostas diferentes (a antiga farsesca, a atual dramática) separadas por trinta anos que transformaram a forma de consumir televisão.
"Que Rei Sou Eu?" era melhor? Outro peso e outra medida para aplicar algum juízo de valor. Fora que a nova novela das sete acabou de começar, foram apenas três capítulos no ar!
Fotos: divulgação/TV Globo.
Siga no Facebook – Twitter – Instagram
ID: {{comments.info.id}}
URL: {{comments.info.url}}
Ocorreu um erro ao carregar os comentários.
Por favor, tente novamente mais tarde.
{{comments.total}} Comentário
{{comments.total}} Comentários
Seja o primeiro a comentar
Essa discussão está encerrada
Não é possivel enviar novos comentários.
Essa área é exclusiva para você, assinante, ler e comentar.
Só assinantes do UOL podem comentar
Ainda não é assinante? Assine já.
Se você já é assinante do UOL, faça seu login.
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Reserve um tempo para ler as Regras de Uso para comentários.