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A praga do não planejamento afeta “Dez Mandamentos” como afetou “Pantanal”

Nilson Xavier

16/11/2015 07h00

Cristiana Oliveira como Juma Marruá / Guilherme Winter como Moisés (Fotos: Dilvulgação)

Cristiana Oliveira como Juma Marruá / Guilherme Winter como Moisés (Fotos: Dilvulgação)

O sucesso de "Os Dez Mandamentos", batendo o Ibope da Globo nas últimas semanas, tem levantado comparações entre a novela bíblica da Record e "Pantanal" (TV Manchete, 1990), trama que entrou para a história não só pelo banho de audiência (no último capítulo, a Manchete bateu a Globo com uma diferença de 20 pontos no Ibope), mas pelo arrebatamento que causou no público, tornando-se um marco em nossa Teledramaturgia.

Para além dos bons números de audiência – e, provavelmente, como razão para eles -, tanto uma quanto a outra se destacaram em suas épocas como opções diferenciadas ao que a Globo vinha apresentando. "Pantanal" revelou ao Brasil as belezas naturais da região que dá título à novela, com uma ambientação e estética inéditas, nunca vistas nas novelas globais. Com boa dose de escapismo, nunca deixou de ser, acima de tudo, um folhetim de qualidade inquestionável.

Não cabe aqui comparação entre a qualidade de uma e outra novela. Todavia, "Os Dez Mandamentos" é também escapista num momento em que o público parece cansado das tramas realistas globais.  O apelo bíblico de uma história mundialmente conhecida em uma produção cheia de pirotecnia aguça a curiosidade até mesmo de quem torce o nariz para histórias bíblicas que todos conhecem.

A preocupação atual da Record é manter o patamar de audiência alcançado e escapar do rótulo de "sucesso momentâneo" para sua novela. Sabemos que a emissora não se preparou adequadamente para a sucessora de "Os Dez Mandamentos", por não imaginar que a novela iria tão longe. Prova do não saber o que fazer ou como lidar com esse sucesso todo é o fato da emissora de Edir Macedo ainda não ter decidido a data para o término de sua novela – se essa semana, ou a próxima, e em qual dia -, esticando-a ao máximo para usufruir o quanto pode dessa repercussão, correndo o risco de comprometer a produção e irritar o telespectador com tanta enrolação.

A falta de planejamento e a má administração do sucesso também acometeram a Manchete. Apesar da boa repercussão inicial da novela "A História de Ana Raio e Zé Trovão", que substituiu "Pantanal", e de "Xica da Silva" (1996, outro êxito isolado), a emissora foi se afundando até fechar suas portas, em 1999. No livro "Rede Manchete, Aconteceu, Virou História" (Imprensa Oficial do Estado de São Paulo), o autor, Elmo Francfort, relata que Lourenço Carvano, gerente de manutenção da Manchete na época de "Pantanal", afirmou que a novela foi um sucesso inesperado que a emissora não soube administrar. Elmo conclui:

"'Pantanal', apesar do sucesso grandioso, com méritos, foi uma faca de dois gumes para a Manchete. A emissora vinha numa linha de crescimento gradativa e a novela foi produzida sem que a Manchete tivesse atingido uma maturidade que a tornasse totalmente estável, principalmente no lado comercial".

Não obstante às mudanças de rumo de última hora, a Record parece depositar agora todas as suas fichas no horário nobre às suas produções bíblicas. Caberá a "Terra Prometida", anunciada para o primeiro semestre de 2016, provar que a boa fase da emissora também está imune à famigerada praga da falta de planejamento.

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Sobre o autor

Nilson Xavier é catarinense e mora em São Paulo. Desde pequeno, um fã de televisão: aos 10 anos já catalogava de forma sistemática tudo o que assistia, inclusive as novelas. Pesquisar elencos e curiosidades sobre esse universo tornou-se um hobby. Com a Internet, seus registros novelísticos migraram para a rede: em 2000 lançou o site Teledramaturgia (http://www.teledramaturgia.com.br/), cujo sucesso o levou a publicar o Almanaque da Telenovela Brasileira, em 2007.

Sobre o blog

Um espaço para análise e reflexão sobre a produção dramatúrgica em nossa TV. Seja com a seriedade que o tema exige, ou com uma pitada de humor e deboche, o que também leva à reflexão.

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