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Texto de "Êta Mundo Bom" exige melhor desempenho da direção e elenco

Nilson Xavier

07/03/2016 07h00

Débora Nascimento e Eriberto Leão (Foto: Divulgação/TV Globo)

Débora Nascimento e Eriberto Leão (Foto: Divulgação/TV Globo)

Percebeu que o núcleo da fazenda de "Êta Mundo Bom" – uma trama paralela que não "conversa" com as demais – tem um tratamento diferenciado dentro da obra? Não é só a fotografia que é diferente (as cenas da fazenda recebem um filtro pastel-escurecido que deixa a imagem com a impressão de envelhecida, enquanto o resto da novela tem uma iluminação mais colorida). A direção de atores também é outra, o que proporciona ao elenco da fazenda outros "tempos de interpretação". Já que nesse núcleo o caipirês carregado prevalece, beirando a caricatura – e a maioria dos atores são excelentes, diga-se de passagem – as falas são menos teatrais e empostadas que nos núcleos da cidade.

Já elogiei o núcleo da fazenda de "Êta Mundo Bom" (leia AQUI), o mais divertido da novela. Claro que uma trama paralela não precisa ter conexão com a história central (João Emanuel Carneiro que o diga!). Mas a fazenda da família de Cunegundes está tão isolada (não apenas geograficamente) que nem parece fazer parte da mesma novela. Quando "Êta Mundo Bom" abre para os núcleos da cidade, muda a cor da novela (a iluminação fica mais clara, em cores vivas) e muda a interpretação dos atores. É quando a direção erra a mão ao fazer o elenco empostar suas falas e declamar palavra por palavra, teatralmente, num português corretíssimo. Pior do que isso é a sensação de jogral (naquelas cenas em que cada ator tem uma fala, dita na sequência, de forma nada natural).

Talvez a ideia de Walcyr Carrasco (o autor) e Jorge Fernando (o diretor artístico) seja justamente marcar bem a distinção entre os personagens da fazenda (os caipiras que falam errado) e os da cidade que, de acordo com a novela, falam um português culto. A diferença está na direção e nos atores. O português errado da fazenda soa natural na boca do elenco, diferente do português corretíssimo da cidade, que soa empostado. Até funciona no teatro. Mas na televisão (ou no cinema) há de se ter cuidado para não parecer que o ator está "canastrando". Daí a importância (da eficiência) do trabalho do ator e do diretor.

Sabemos que Walcyr Carrasco tem esse estilo teatral na escrita, já visto em trabalhos anteriores. Acho até condizente com a proposta ora farsesca ora melodramática de "Êta Mundo Bom". Fica bonito na boca de atores como Marco Nanini e Eliane Giardini, que não dependem tanto de uma direção mais atenciosa. Ana Lúcia Torre, Débora Oliveiri, Bianca Bin, Mariana Armelini também conseguem escapar incólumes. O problema (de atuação e direção) é percebido em Eriberto Leão, Flávia Alessandra, Rainer Cadete, Klebber Toledo, Tarcísio Filho, Priscila Fantin, Rômulo Arantes Neto, Débora Nascimento (cujo sotaque caipira já foi abortado, ainda bem!). É preciso ressaltar que já vimos alguns desses atores se saírem bem em outras propostas de dramaturgia e de direção.

Walcyr Carrasco não tem um texto fácil e ainda exige que o ator siga à risca o que ele escreve, sem cacos (a contribuição do ator). Seu texto funciona quando o ator é tarimbado. Em contrapartida, exige uma direção rigorosa para que tudo não resvale no "jogral de escola".

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Sobre o autor

Nilson Xavier é catarinense e mora em São Paulo. Desde pequeno, um fã de televisão: aos 10 anos já catalogava de forma sistemática tudo o que assistia, inclusive as novelas. Pesquisar elencos e curiosidades sobre esse universo tornou-se um hobby. Com a Internet, seus registros novelísticos migraram para a rede: em 2000 lançou o site Teledramaturgia (http://www.teledramaturgia.com.br/), cujo sucesso o levou a publicar o Almanaque da Telenovela Brasileira, em 2007.

Sobre o blog

Um espaço para análise e reflexão sobre a produção dramatúrgica em nossa TV. Seja com a seriedade que o tema exige, ou com uma pitada de humor e deboche, o que também leva à reflexão.

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