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Novelas antigas de Manoel Carlos eram mais vibrantes que “Em Família”

Nilson Xavier

18/04/2014 16h27

Julia Lemmerttz e Natália do Valle em

Julia Lemmerttz e Natália do Valle em "Em Família" (Foto: Divulgação/TV Globo)

Passada a fase de estranhamento com as idades equivocadas do elenco, já se percebe um maior ritmo na novela das nove da Globo, "Em Família". Há quase três meses no ar, a trama de Manoel Carlos vem capengando na audiência. E, se permanecer nesse patamar, não vai escapar da pecha de "menor Ibope da história entre as novelas das nove da emissora". Mas, será que uma agilidade maior nos acontecimentos da trama será o suficiente para despertar a audiência adormecida do horário?

Atualmente está em reprise no canal Viva outra novela de Manoel Carlos, mais antiga: "História de Amor", originalmente exibida entre 1995 e 1996, no horário das seis. Considerado um dos melhores trabalhos de Maneco – com Regina Duarte vivendo uma das melhores Helenas do autor – "História de Amor" é um primor de novela, seja pela narrativa, pela trama, pela direção, ou por tudo isso. E a comparação com "Em Família" é inevitável. Apesar de injusta, uma vez que os tempos são outros, a audiência se comporta diferente do que era na década de 1990, e não se deve comparar uma novela inteira que ficou na memória afetiva do público com outra que está apenas começando. Mas, o autor é o mesmo.

Diferente da atual novela, "História de Amor" dá gosto de acompanhar. Algumas tramas são até parecidas, mas a maneira como são conduzidas e levadas ao público é bem diferente. Nem parecem histórias do mesmo autor. Os personagens de "História de Amor" são mais humanos que os de "Em Família" – logo, mais fácil para gerar identificação com o público. A Helena de Regina Duarte não tem nada de sofisticada. Pelo contrário, é uma mulher simples, quase desprovida de vaidade, comum. Os personagens mais pobres vivem de forma natural os dramas cotidianos da sua classe.

Esse naturalismo sempre foi a marca indelével do autor. O preço do chuchu na feira já foi citado pela Helena de Regina Duarte e pela Helena de Júlia Lemmertz. Mas quanta diferença! As Helenas de Manoel Carlos atingiram um grau de glamorização tão alto que não dá para acreditar que elas façam feira. Aliás, a Helena de "Em Família" parece ter sido plantada naquela feira para justificar o estilo do autor. Assim como Helena, os demais personagens parecem sem alma, frios, de plástico. Ou não são de fato frios, mas são conduzidos dessa forma.

Regina Duarte e Carla Marins em

Regina Duarte e Carla Marins em "História de Amor" (Foto: Divulgação/TV Globo)

Neste início de "História de Amor" (a reprise estreou no Viva há pouco mais de dois meses), duas tramas centrais se destacam: a gravidez prematura de Joice (Carla Marins), que ela e a mãe Helena (Regina Duarte) tentam esconder do pai severo, Assunção (Nuno Leal Maia); e o casamento desajustado de Carlos (José Mayer) e Paula (Carolina Ferraz), que, apesar deles serem recém-casados, já está em crise por conta da imaturidade da moça.

São dramas até corriqueiros para uma novela, mas conduzidos de forma magistral. Não tem como não vibrar ou torcer pelos personagens, que agem de forma humana, errando e metendo os pés pelas mãos, como todo mundo, sem maniqueísmos. Vale salientar aqui a direção de Ricardo Waddington, que imprime com maestria toda essa naturalidade que o texto de Manoel Carlos pede, mas com ritmo, agilidade. A novela não cansa nem é monótona. Essa mesma condução seria percebida nas tramas seguintes do autor dirigidas pelo diretor: "Por Amor" (1997-1998), "Laços de Família" (2000-2001) e "Mulheres Apaixonadas" (2003).

Jayme Monjardim, o diretor de "Em Família", conduz a novela de forma mais contemplativa. Só que, essa direção, aliada ao texto de Maneco, resulta preguiçosa na tela, quase blasé. Também já se percebeu isso nas novelas do autor dirigidas por Jayme que vieram depois de "Mulheres Apaixonadas": "Páginas da Vida" (2006-2007) e "Viver a Vida" (2009-2010) – por acaso, com menos repercussão que as anteriores, dirigidas por Waddington. Ou, não por acaso.

Falta carisma aos personagens de "Em Família". Falta torcer pelos seus dramas. E falta uma mão firme para conduzir essa trama de forma mais vibrante, mais dinâmica. "Em Família" está insossa, sem graça. Fica difícil até torcer pela novela, quanto mais pelos personagens e suas histórias.

Sobre o autor

Nilson Xavier é catarinense e mora em São Paulo. Desde pequeno, um fã de televisão: aos 10 anos já catalogava de forma sistemática tudo o que assistia, inclusive as novelas. Pesquisar elencos e curiosidades sobre esse universo tornou-se um hobby. Com a Internet, seus registros novelísticos migraram para a rede: em 2000 lançou o site Teledramaturgia (http://www.teledramaturgia.com.br/), cujo sucesso o levou a publicar o Almanaque da Telenovela Brasileira, em 2007.

Sobre o blog

Um espaço para análise e reflexão sobre a produção dramatúrgica em nossa TV. Seja com a seriedade que o tema exige, ou com uma pitada de humor e deboche, o que também leva à reflexão.

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